Victor Havro de Sá Grein
Entende-se como jornada de trabalho o período em que o trabalhador fica efetivamente à disposição do empregador durante o horário de trabalho, razão pela qual é do empregador o ônus de definir a carga horária diária/semanal a ser executada por cada funcionário.
Ocorre, todavia, que o empregador não pode estabelecer horário de trabalho desvencilhado de qualquer parâmetro normativo, eis que no Brasil existem limitadores constitucionais e legais da jornada de trabalho que devem, por sua vez, ser observados no momento da contratação.
Assim, conforme preleciona o art. 7°, inciso XIII da Constituição Federal, a jornada de trabalho, em regra, é de oito horas diárias e quarenta e quatro horas semanais. Contudo, há casos em que a atividade empresarial exige um tempo à disposição maior do empregado, seja pela necessidade de operações em máquinas que não podem ser desligadas ou até mesmo o monitoramento incessante de uma portaria de condomínio residencial.
Portanto, admite-se em casos excepcionais estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas de descanso (12×36), desde que preenchidas as formalidades previstas no art. 59-A da CLT. Nesses casos, entretanto, a empresa deve ter cautela ao implementar a escala de seus funcionários, de modo que não haja alternância de turnos de maneira periódica.
Exemplo: empresa que funciona 24 horas por dia. O empregado, um mês, labora das 05h às 17h e no outro mês (o mesmo funcionário) inicia sua jornada às 17h e finaliza às 05h. Neste caso, existem turnos ininterruptos de revezamentos entre os funcionários, uma vez que o período de trabalho compreendeu (no todo ou em parte) o horário diurno e o noturno de maneira alternada.
Haveria um cenário, portanto, em que o labor noturno seria inevitavelmente exigido, mas em virtude da troca de escala periódica, o mesmo funcionário que outrora laborou em horário noturno, passaria a trabalhar de dia e descansar normalmente durante a noite, de modo a não imputar trabalho noturno para apenas um grupo determinado de trabalhadores. Logo, a rotatividade entre os turnos, na prática, pode ser cogitada como uma forma de evitar situação de injustiça entre funcionários contratados para serviços que não podem ser suspensos de um dia para o outro.
Há uma forte tendência, no entanto, de que tal situação configure turno ininterrupto de revezamento. Em outras palavras, é aquela jornada de trabalho que se opera sob o sistema de revezamento, em turno e de forma ininterrupta, sem que haja um horário fixo de trabalho.
Se a jornada de trabalho que – a princípio era de 12×36 – for entendida como turno ininterrupto de revezamento, surge um limitador da carga horária de apenas seis horas diárias, nos termos do art. 7°, XIV da Constituição Federal. Isso ocorre, pois, o comando normativo supracitado entende que a ausência de um horário fixo é prejudicial à saúde do trabalhador, sendo irrelevante que a atividade da empresa se desenvolva de forma ininterrupta.
Afinal, quais seriam as consequências jurídicas de a jornada 12×36 ser interpretada como turno ininterrupto de revezamento?
Perceba que durante toda a vigência do contrato de trabalho, o empregador pagou eventual adicional de horas extras somente quando o trabalho excedia da 12ª hora diária, já que a jornada contratada era de doze horas por dia.
Logo, se a jornada de trabalho 12×36 for desconsiderada pelo Poder Judiciário e houver reconhecimento do turno ininterrupto de revezamento, o trabalhador pode conseguir o recebimento de horas extras para além da 6ª hora diária e não da 12ª hora diária, resultando expressivo aumento no valor de eventual condenação e evidente prejuízo à empresa.
Para a jurisprudência[1], pouco importa se a troca de escala acontecerá semanalmente, quinzenalmente, bimestralmente etc. Se o turno é alterado de maneira periódica, ainda que a cada 4 meses, a jornada de trabalho deve se limitar em apenas seis horas diárias.
Portanto, dependendo das necessidades da empresa, a exemplo dos serviços de vigilância, hospitais, portaria, indústrias e entre outros, a jornada de trabalho 12×36 pode ser bastante vantajosa, pois tais atividades operam-se de maneira inadiável, isto é, não podem parar sob risco de prejudicar a funcionalidade e essência do negócio empresarial.
No entanto, conforme mencionado, qualquer descuido na organização da escala entre funcionários pode configurar turno ininterrupto de revezamento, com possibilidade, inclusive, de condenação em horas extras para além da 6ª hora diária em eventual reclamatória trabalhista.
Para mais informações sobre o tema, consulte nossa equipe da Clivatti e Wengerkiewicz Advocacia Empresarial.
[1] TST – Ag-RR-2465-80.2013.5.02.0022, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 14/05/2021.