Aspectos jurídicos do Manual de Uso, Operação e Manutenção da Edificação na prevenção de litígios

7 de junho de 2022

Dra. Giseli Ito Gomes Afonso | OAB/PR 40.356

Por força do parágrafo único do artigo 50 do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), as Construtoras e Incorporadoras são obrigadas a elaborar e fornecer, no ato da entrega do Empreendimento, os Manuais de Uso, Operação e Manutenção da Edificação (Manual do Proprietário e das Áreas Comuns), senão vejamos:

 Art. 50. A garantia contratual é complementar à legal e será conferida mediante termo escrito.

Parágrafo único. O termo de garantia ou equivalente deve ser padronizado e esclarecer, de maneira adequada em que consiste a mesma garantia, bem como a forma, o prazo e o lugar em que pode ser exercitada e os ônus a cargo do consumidor, devendo ser-lhe entregue, devidamente preenchido pelo fornecedor, no ato do fornecimento, acompanhado de manual de instrução, de instalação e uso do produto em linguagem didática, com ilustrações.

No entanto, muitas vezes, as Construtoras e Incorporadoras de imóveis deixam de dar a devida importância aos aspectos jurídicos durante a elaboração dos Manuais de Uso, Operação e Manutenção da Edificação (Manual do Proprietário e das Áreas Comuns), os quais podem ser utilizados como importante ferramenta na prevenção de litígios com os seus futuros clientes.

Além de ser importante documento para assegurar a vida útil da Edificação, o Manual de Uso, Operação e Manutenção, tanto das áreas privativas (Manual do Proprietário), quanto das áreas comuns do Empreendimento, é um compilado de informações, instruções e regramentos que irão conduzir a relação entre Construtora/Incorporadora e os proprietários/usuários e síndico após a entrega da obra.

De acordo com o disposto na Norma Técnica da ABNT NBR 14037, a elaboração do Manual de Uso, Operação e Manutenção das Edificações deve atender requisitos mínimos, de forma a:

  • informar aos proprietários e ao condomínio as características técnicas da edificação construída;
  • descrever procedimentos recomendáveis e obrigatórios para a conservação, uso e manutenção da edificação, bem como, para a operação dos equipamentos;
  • em linguagem didática, informar e orientar os proprietários e o condomínio com relação às suas obrigações no tocante à realização de atividades de manutenção e conservação, e de condições de utilização da edificação;
  • prevenir a ocorrência de falhas ou acidentes decorrentes do uso inadequado, e
  • contribuir para que a edificação atinja a vida útil de projeto.

Além disso, o Manual de Uso, Operação e Manutenção deve conter os prazos de garantia dos sistemas, elementos, componentes e instalações da Edificação, recomendando-se a indicação expressa acerca do marco inicial de tal prazo.

O artigo 618 do Código Civil estabelece o prazo de garantia irredutível de cinco anos no tocante à segurança e solidez da edificação, vejamos:

Art. 618. Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo.

No entanto, além da citada garantia legal, outros sistemas, elementos e componentes da Edificação podem ter prazos de garantia variados, devendo conter expressamente a discriminação de cada um deles no referido Manual.

Do mesmo modo, as condições de perda de garantia devem ser expressamente detalhadas, em linguagem clara e didática, de forma a assegurar o direito à informação previsto na Legislação Consumerista, e, por outro lado, prevenir eventuais responsabilidades que não caibam às Construtoras e/ou Incorporadoras.

Ainda, o Manual de Uso, Operação e Manutenção deve conter o Programa de Manutenção em conformidade com a ABNT NBR 5674, recomendando-se sugestões de atividades e periodicidade da manutenção preventiva de cada sistema/elemento/componente da Edificação.

Tamanha a importância, orienta-se que o Manual contenha a informação em destaque acerca da obrigatoriedade da implementação do Programa de Manutenção Preventiva completo pelo proprietário e síndico, bem como, da implementação de um sistema de gestão e planejamento orçamentário que contemple a execução de cada uma delas.

De acordo com a ABNT NBR 5674 devem ser mantidos registros legíveis e disponíveis para viabilizar a demonstração da efetiva implementação do Programa de Manutenção, das inspeções e da efetiva realização das manutenções.

Portanto, é dever do proprietário (no tocante à área privativa) e do síndico/administradora do condomínio (em relação às áreas comuns) registrar a realização das inspeções e das manutenções, bem como, coletar e manter arquivados os documentos relacionados às respectivas atividades, dentre os quais, citamos por amostragem:

  • relatórios de manutenções;
  • notas fiscais;
  • contratos;
  • ART-Anotação de Responsabilidade Técnica;
  • Certificados ou termos de garantia, etc.

O arquivamento dos referidos documentos é de suma importância, pois a Construtora e/ou Incorporadora poderá condicionar a garantia de cada sistema/elemento/componente da Edificação à correta manutenção, desde que tal informação esteja de forma expressa e em destaque no Manual de Uso, Operação e Manutenção da Edificação.

Neste caso, se o proprietário/usuário/síndico não cumprir com suas obrigações expressamente previstas no Manual, a Construtora e/ou Incorporadora não poderá ser responsabilizada por eventual falha no desempenho da Edificação resultante de tal descumprimento.

Portanto, expor de forma clara e objetiva quais são os direitos, garantias e obrigações de cada parte, permite a correta utilização e o incentivo à manutenção preventiva e corretiva pelos proprietários/usuários/síndico, de forma a preservar a durabilidade da Edificação, e, consequentemente, prevenir a responsabilidade da Construtora e/ou Incorporadora por eventuais danos decorrentes do mau uso e/ou negligência na manutenção obrigatória do Empreendimento.